Mittwoch, 7. Juli 2010

O CÃO SAQUEADO

RUVAN DE ALMEIDA

Mais que uma rua cruzada por um cão.
Mais que um caqui apunhalado.
Mais que a lingua do cão que te lambeu
e da fonte cor-de-rosa bebeu,
crendo ser fruta de alguma árvore.
Andamos e a paisagem fluía,
Como uma espada de líquido espesso.
Eu, um cão, humilde e espesso
Como árvore sem voz,
roendo o que não tinha,
sabendo da porta sem porta,
que arrombara e não abrira.
Porque na água cor-de-rosa me perdi?
Perdido sem espelho para me enxergar
Perdi-me como a água derramada.
Difícil saber o que é água e o que é lama.
Como um cão que não temia o rio,
calei ao sangrar num canto,
uma voz a me mastigar as patas,
a vida mastigada e não dissolvida,
naquela água macia que amoleceu meus ossos.
Ainda em minha memória, como um cão no bolso
Incomodando o silêncio, o sono, o corpo que sonhou
Os dentes ainda cortando-me a boca
fluindo meu sangue espesso de cão,
de cão faminto e sendento de água cor-de-rosa
fluindo meu sangue de cão, sarnento e aniquilado,
de cão sem plumas.
Páro como um cão apunhalado, 
como um cão humilde e espesso
mais que um cão saqueado,
como um cão que já não anda,
já não late,
escabiótico e humilhado
tombo como um cão,
como um cão assassinado.

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